sexta-feira, 2 de outubro de 2009

economia


Uma vez que a economia política gosta das robinsonadas, visitemos então Robinson na sua ilha. Embora naturalmente modesto, nem por isso tem menos necessidades diferentes a satisfazer, sendo-lhe necessário executar trabalhos úteis de várias espécies, por exemplo, fabricar móveis, fazer utensílios, domesticar animais, pescar, caçar, etc. Acerca das suas orações e outras bagatelas semelhantes nada temos a dizer, pois que o nosso Robinson encontra nisso o seu prazer, considerando essas actividades como uma distracção tonificante. Apesar da variedade das suas funções produtivas, ele sabe que elas são apenas as diversas formas pelas quais se afirma o próprio Robinson, isto é, são simplesmente modos, diversos de trabalho humano. As próprias necessidades obrigam-no a dividir o seu tempo pelas diferentes ocupações. O facto de uma ocupar um maior, e outra um menor lugar no conjunto dos seus trabalhos, depende da maior ou menor dificuldade que tem de vencer para conseguir o resultado útil que tem em vista. É a experiência que lho ensina, e o nosso homem que salvou do naufrágio relógio, livro-razão, pena e tinta, não tarda, como bom inglês que é, a anotar todos os seus actos diários. O seu inventário contém a descrição dos objectos úteis que possui, dos diferentes modos de trabalho que a sua produção exigiu e, finalmente, do tempo de trabalho que lhe custaram, em média, determinadas quantidades destes diversos produtos. Todas as relações de Robinson com as coisas, que formam a riqueza que ele próprio criou, são de tal modo simples e transparentes que qualquer pobre de espírito as poderia compreender sem grande esforço intelectual. E, no entanto, estão aí contidas todas as determinações essenciais do valor. Passemos agora da ilha luminosa de Robinson para a sombria Idade Média europeia. Em vez do homem independente, todos aqui se encontram dependentes: servos e senhores, vassalos e suseranos, leigos e clérigos. Esta dependência pessoal caracteriza tanto as relações sociais da produção material, como todas as outras esferas da vida assentes sobre ela. E é precisamente porque a sociedade se baseia na dependência pessoal que todas as relações sociais nos aparecem como relações entre pessoas. Por isso, os diversos trabalhos e os seus produtos não têm necessidade de assumir uma figura fantástica distinta da sua realidade. Surgem [no mecanismo social] como serviços e prestações em espécie. É também a forma natural do trabalho, a sua particularidade e não a sua generalidade, o seu carácter abstracto, como na produção mercantil -, que é aqui a sua forma [directamente] social. A corveia, tal como o trabalho que produz mercadorias, é igualmente medida pelo tempo; mas todo o camponês sabe muitíssimo bem - sem necessidade de recorrer a um Adam Smith - que é uma quantidade determinada da sua força de trabalho pessoal que ele dispende ao serviço do seu senhor. O dízimo a pagar ao cura é bem mais claro que a bênção deste. Como quer que julguemos os papéis que os homens desempenham nesta sociedade [uns perante os outros], as relações sociais das pessoas nos seus trabalhos respectivos afirmam-se com toda a nitidez como as suas próprias relações pessoais, não se dissimulando em relações sociais das coisas, dos produtos do trabalho.

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